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9 de dezembro de 2012

Passos nas Nuvens 3

"Olhou-me nos olhos e esperou. Esperou apenas alguns segundos, até me tomar nos braços, encostando a minha cabeça no seu peito. Manteve uma mão presa na minha, enquanto passava o outro braço sobre os meus ombros. Com a ponta dos dedos acariciava-me o rosto, junto da orelha, em movimentos cadenciados e suaves.
Afastei o rosto do peito dele, onde as lágrimas e o meu cabelo tinham deixado uma marca molhada na camisola.
-Eu sei que custa. – disse-me olhando-me nos olhos. Uma pequena lágrima formava-se nos seus, prestes a deslizar pelo seu rosto.
O meu orgulho e mágoa não me tinha permitido entender que a minha dor era afinal uma dor comum. Que o meu sofrimento era igual ao dele. Que uma vez mais estávamos unidos por uma força maior do que as nossas diferenças.
Apoiei a mão livre no peito dele, onde senti o seu coração bater num ritmo lento e certo, e afastei-me ligeiramente. Apertei a mão que ele ainda tinha posta na minha.
-Custa tanto… Custa-nos tanto.
Cláudio retribuiu o aperto firme da minha mão.
Uma troca de olhares bastou. No segundo seguinte as nossas bocas estavam cheias de promessas, suplicas, beijos e lágrimas.
Por momentos nada mais importava. As nossas peles conheciam-se, os nossos corpos completavam-se.
O sabor familiar dos beijos, misturados com chuva e sal.
A mistura perfeita do doce com o salgado, envolvidos na força de uma necessidade reprimida, firmados na dor da saudade.
Cláudio agarrou-me com uma suavidade segura. Uma certeza, uma fome e sede de beijos.
Eu mal conseguia conciliar a necessidade de tocar a pele dele, com a necessidade de o afastar.
A minha respiração era uma luta entre os soluços e a urgência do seu toque.
A chuva continuava a cair com força, acompanhando as gotas que deslizavam em conjunto pelos nossos rostos.
Afastei-me numa tentativa de retomar o domínio sobre a minha mente e conseguir regularizar a minha respiração.
O Cláudio olhou-me, tentando ele próprio controlar-se. Os seus olhos sorrindo, pousados nas nossas mãos ainda unidas.
Deitei a cabeça no peito dele e ele afastou-me o cabelo do rosto, afagando-me eternamente.
Ficámos ali, parados no escuro.
-Tenho de ir para casa. –disse-lhe acariciando os dedos que tinha pousados sobre os meus.
Depositou-me um beijo nos lábios. Sorriu-me e eu saí. Ligou as luzes do carro e avançou para a passagem.
Debaixo da chuva forte, corri para o coberto da frente da minha casa.
Vi-o fechar o portão da garagem, sair e encostar-se ao portão onde ficou a sorrir-me, deixando a água correr-lhe pelo cabelo.
Nenhum de nós parecia querer mover-se.
O momento congelado no tempo, parecia guardar em si os segredos de muitas vidas. Preservar as promessas feitas sob o sabor das lágrimas.
Suspenso no ar, como seguro por magia, pairava ainda a sensação do toque de duas peles que se reconheciam.
Um raio rasgou o céu, iluminando o rosto de Cláudio, e as pestanas compridas e curvilíneas de onde pendiam gotas de chuva.
Um ultimo sorriso antes de outro raio fazer o tempo correr de novo.
Entrei com o vestido a pingar para o chão, arrastando a cauda pelas escadas.
Não tinha frio, sentia ainda a pressão da mão do Cláudio presa na minha e o calor dos seus braços envoltos no meu corpo.
Olhei pela janela do quarto ate ver a luz do quarto dele apagar-se. Despi-me e enfiei-me na cama ainda com o cabelo molhado mas o coração leve e quente."


In: Passos nas Nuvens

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